(em atualização)
“Estou traumatizada. Não estou feliz, não consigo dormir. Estou tão zangada, é de doidos. E estou deprimida”, disse esta quarta Britney Spears numa audiência virtual no Tribunal Superior do Condado de Los Angeles, a propósito da tutela estabelecida em 2008 — desde então, a estrela da pop não tem controlo sobre as suas finanças. “Não estou aqui para ser escrava de ninguém”, afirmou.
Depois de ter sido apresentada pelo advogado que a representa, Samuel Ingham III, que perante a juíza Brenda Penny garantiu não ter “controlado, filtrado ou editado” o testemunho da cliente, foi a vez da cantora de 39 anos falar: “O meu pai e todas as pessoas envolvidas na tutela (…) deviam estar na prisão”, afirmou, citada pelo The Independent e pela CNN. “A última vez que falei consigo [com a juíza]… senti-me como se estivesse morta. Estou a dizer isto outra vez porque não estou a mentir… talvez possa entender a profundidade, o grau e os estragos… Eu mereço mudanças.”
Spears comentou que não disse ao público como se sentia com medo que ninguém acreditasse nela. “Só quero a minha vida de volta. É o suficiente.” A cantora afirmou ainda que quer “processar a família” e contar a sua história ao mundo”. O depoimento da cantora vai no sentido de terminar a tutela sem que seja avaliada por profissionais de saúde, afirmando que já “fez o suficiente”. O advogado esclareceu, no entanto, que Britney ainda não o instruiu a formalizar o respetivo pedido.
“Quero poder casar-me e ter um filho”, continuou, alegando que a equipa não o permite. “Tenho um DIU [dispositivos intrauterinos] dentro de mim para não engravidar, mas [a minha equipa] não quer que eu tenha mais filhos.”
A cantora comentou ainda que faz terapia três vezes por semana e ainda consulta um psiquiatra. Sobre a tutela em vigor desde 2008, afirmou: “Acredito realmente que esta tutela é abusiva. Não sinto que posso viver uma vida plena”. De acordo com o The New York Times, o depoimento de Britney durou 23 minutos.
Vivian Lee Thoreen, advogada do pai da cantora, leu um curto comunicado: “Ele [Jaime Spears] lamenta ver a filha a sofrer e em tanta dor. O Sr. Spears ama a filha e sente muito a sua falta.”
A audiência esta quarta-feira foi pedida em abril através do advogado da cantora, Samuel Ingham III, que não especificou o assunto a ser discutido pela estrela da pop — Britney não se dirigia ao tribunal há mais de dois anos.
Um dia antes, o The New York Times revelava novos detalhes do caso, depois de garantir acesso a documentos legais confidenciais que mostram o controlo feito sobre a vida da artista e como esta já antes se opôs ao papel do pai enquanto tutor — anos antes do movimento #FreeBritney empolar o caso, anos antes do NYT dedicar um documentário à queda da artista. Os documentos deixam a descoberto uma vida cheia de restrições, com Jamie Spears, o pai, a controlar a vida de Britney ao ínfimo detalhe: desde o círculo de amigos à cor dos armários da cozinha. A artista chegou a alegar que o pai estava “obcecado”.
Um investigador do tribunal escreveu, num relatório datado de 2016, como Britney sentia que a tutela se tinha transformado, ao longo dos anos, “numa ferramenta opressora e de controlo”. A cantora reiterou que o sistema tinha “demasiado controlo”, assegurou que queria que a tutela fosse terminada o mais depressa possível e que estava “cansada” de ser explorada. “Ela disse que é ela quem trabalha e ganha o dinheiro, mas todos à sua volta estão na folha de pagamento.”
A investigação em causa, tal como se lê no relatório, determinou em 2016 que a tutela continuaria a ser uma alternativa positiva para artista, ou seja, teria o seu melhor interesse em conta devido às finanças complexas, à sua suscetibilidade a influências indevidas e aos problemas “intermitentes” com drogas, ainda que o caminho fosse no sentido da “independência e eventual término da tutela”.
Os documentos já citados mostram ainda que Britney questionou a aptidão do pai mais do que uma vez. Em 2014, numa audiência fechada ao público, o advogado da artista, nomeado pelo tribunal, falou em retirar o poder a Jamie alegando problemas com o álcool, entre outras objeções. Em 2020, Samuel Ingham III afirmou ainda que a sua cliente “tinha medo do pai”.
O NYT acrescenta que, em 2019, Britney afirmou perante o tribunal que foi forçada a dar entrada numa instituição de saúde mental. A cantora terá encarado isso como um castigo por levantar objeções durante um ensaio a propósito da sua residência em Los Angeles. Foi, aliás, num desses espetáculos que foi forçada a atuar com febre, apelidando esse momento como “um dos mais assustadores” da vida. Entretanto, vídeos desse show começaram a circular online.
Dear @britneyspears ….I feel like we owe you an apology. We bought into the whole hype of BRITNEY the performer, without much consideration for how Britney Jean Spears, the person, was coping through each day. Looking back now, I remember you saying this in front of me… pic.twitter.com/I80ODPKPvq
— Zachary Gordon (@ZacharyGordon95) June 22, 2021
A tutela em questão, que arrancou em fevereiro de 2008, seria temporária e foi uma resposta às recaídas muito públicas da cantora: entre 2007 e 2008, Britney rapou o cabelo, atacou um grupo de paparazzi com um guarda-chuva, passou por mais do que uma clínica de reabilitação e perdeu a guarda dos filhos para o ex-marido, Kevin Federline. Foi ainda ridicularizada pela sua performance na abertura dos MTV Music Video Awards, onde aparentou estar em baixo de forma. À data da criação da tutela, os pais emitiram uma declaração descrevendo Britney como “uma criança adulta a meio de uma crise de saúde mental”. A 28 de outubro de 2008, os advogados conseguiram que a tutela fosse permanente, podendo ficar efetiva até à morte de Jamie. Sob a tutela, Britney perdeu o direito de contratar o seu próprio advogado. Há 13 anos que a cantora, que em 2021 celebra 40 anos, não tem controlo legal sobre a sua vida ou fortuna.
Em fevereiro deste ano, Jamie Spears viu negado o seu pedido para exercer, em exclusivo, a tutela sobre a fortuna da filha, avaliada em cerca de 60 milhões de dólares. No tribunal de Los Angeles, o juiz determinou que Jamie partilhasse a gestão dos bens de Britney com a empresa de fundos fiduciários Bessemer Trust, entidade apontada pela juíza Brenda Penny em novembro de 2021 e que passou, então, a assumir igual poder na tutela das suas finanças. A referida empresa já ocupava a posição de corresponsável pela tutela, dividindo agora a tutela com Jamie, de forma equitativa. À data, esta foi uma vitória parcial para a cantora que já no final do ano passado havia demonstrado o desejo de que o pai deixasse de controlar a sua fortuna.
Britney Spears pede fim da tutela: "Estou traumatizada. Não estou feliz. Quero a minha vida de volta" - Observador
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