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Monday, November 1, 2021

Morreu Nelson Freire, um monstro do piano mundial que falava português - Expresso

Há três anos, numa entrevista escrita ao Expresso, das raríssimas que dava, Nelson Freire disse: "Além do meu meio de expressão, o piano representa a forma de me comunicar com o mundo. É um companheiro de toda uma vida que conhece todos meus defeitos e qualidades, sempre estou aprendendo com ele. Já passei por situações trágicas, e se não fosse a música, não teria sobrevivido." Mas a música não o salvou. Aos 77 anos, o pianista morreu na madrugada de segunda-feira no Rio de Janeiro, em casa.

Embora não se conheçam as causas da morte, sabe-se que tinha entrado em depressão profunda após uma fratura do braço direito em 2019, na sequência de uma queda, que o obrigou a uma complicada e longa cirurgia.

De outubro desse ano data uma das últimas apresentações públicas do músico, em Minas Gerais, o Estado brasileiro onde nasceu, tendo sido cancelados os concertos seguintes, agendados para Girona, Londres e Amesterdão, Lyon e São Petersburgo. Segundo o jornal "Folha de São Paulo", Freire receberia então a visita da pianista argentina Martha Argerich, quem fazia parte do seu núcleo próximo de amigos. O regresso aos palcos estava previsto para 2020, mas devido à pandemia não se concretizou. Nesse ano, cancelou dois concertos na Fundação Gulbenkian, em Lisboa. Em agosto de 2021, chegou a confirmar a presença no Festival Internacional dos Açores, realizado no Faial, local de onde os seus antepassados eram originários. Porém, a viagem não teve lugar.

Nelson Freire era, como o define a France Musique, "um monstro sagrado do piano" e um dos grandes pianistas de sempre. Nascido em Boa Esperança, em 1944, começou a tocar aos três anos, por influência de uma irmã mais velha, e deu o primeiro recital aos cinco. A mudança da família para o Rio de Janeiro proporcionou-lhe a tutoria de grandes pianistas brasileiros como Nise Obino e Lúcia Branco. Aos 12 anos, ganha o Concurso Internacional do Rio de Janeiro - interpretando o Concerto Nº5, “Imperador”, de Beethoven - e aos 19 o Concurso Internacional Vianna de Motta, em Lisboa. Nessa idade, em que foi também distinguido com a Medalha Dinu Lipati, já estava a estudar em Viena e a fazer concertos em capitais europeias sob a direção de maestros como Isaac Karabtchevsky e Rudolf Kempe. Aos 24 anos, a estreia com a Orquestra Filarmónica de Nova Iorque consolidou a sua carreira internacional – não por acaso, após esse concerto, a revista “Time” o definiu como “um dos maiores pianistas desta e de qualquer geração”.

Ao longo da vida, preferiu as apresentações ao vivo aos estúdios de gravação. Mesmo assim, registou Chopin como ninguém e Johannes Brahms (a sua leitura dos dois Concertos para Piano ficará para a história), assim como Heitor Villa-Lobos, Liszt e Rachmaninov. Nos anos 80, foi dos poucos pianistas selecionados para integrar a coleção “Great Pianists of the Century”, editada pela Phillips. Em 2003, o realizador João Moreira Salles dedicou-lhe um documentário, e em 2015 foi retratado no livro “Nelson Freire: a pessoa e o artista”, de Ricardo Fiúza.

Na entrevista dada ao Expresso, Nelson Freire escreveu a máquina, com muitas anotações a mão - documento que depois digitalizou para enviar. A dada altura, à pergunta sobre os aspetos mais importantes na interpretação, respondia: “Fidelidade do texto, honestidade de intenções, veracidade na emoção, criatividade, inspiração e....uma lua a favor!” Mais à frente, notava: “O que seria do ser humano se não houvesse arte? O artista não engana ninguém: seu ofício lhe exige severa disciplina, honestidade. E o público agradece oferecendo-lhe afeto e admiração.”

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